domingo, junho 03, 2007

Boa noite, meu vestidinho verde...

"Boa noite, meu vestidinho verde, não consintas que eu te interrompa. Deixa-te estar como estás, na tua cadeira de baloiço, como num berço. Põe as mãos na nuca como as tinhas dantes. Adoro olhar para ti assim, quando o teu corpo descansa preguiçosamente e só as pontas dos teus seios traem a expectativa e inquietação em que ficas quando me aproximo de ti. Desprende os cabelos para que as minhas mãos tenham de ti alguma coisa que as entretenha.
Os pássaros estão soltos? Correste as cortinas de maneira que ninguém possa espreitar para dentro da nossa gaiola doirada? Como as flores resplendem!
Disseste um dia que as minhas palavras são como sementes lançadas no teu coração e que o teu coração era como um solo, muita areia, muitas pedras, mas também algumas jeiras de boa terra húmida. E acrescentaste: era um solo estéril em que as minhas palavras caíam e que um dia daria cem por cada palavra lançada. Será assim quando eu vier ceifar a seara, piedosa e pecadora deusa da criação?
Meu vestidinho verde, tu és adorável como um quadro encantado que os meus olhos animam e despertam para a vida. Ou dar-se-á o caso de só estares encantada quando eu estou contigo? Ou serão os meus olhos encantados que não podem deixar de olhar para ti enquanto as mãos não te alcançam, enquanto os ouvidos não ouvem a tua voz, enquanto a boca anseia pela tua? Essa dúvida toma-me o corpo todo como uma febre instantânea e violenta, na demora de possuir-te.
Apaga a luz. Há muito tempo que os meus olhos aprenderam a reconhecer-te no escuro da noite; há muito tempo que as minhas mãos conhecem todos os vales e curvas do teu..."

Christine Brückner

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