sábado, junho 30, 2007

Mar sonoro...

"Mar sonoro, mar sem fundo mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós.
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim."

Sophia de Mello Breyner Andresen

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Marriage of the virgin...

Giotto di Bondone
(1304-06)

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segunda-feira, junho 25, 2007

Natureza humana...

"Cheguei. Sinto de novo a natureza
Longe do pandemônio da cidade
Aqui tudo tem mais felicidade
Tudo é cheio de santa singeleza

Vagueio pela murmura leveza
Que deslumbra de verde e claridade
Mas nada. Resta vívida a saudade
Da cidade em bulício e febre acesa

Ante a perspectiva da partida
Sinto que me arranca algo da vida
Mas quero ir. E ponho-me a pensar

Que a vida é esta incerteza que em mim mora
A vontade tremenda de ir-me embora
E a tremenda vontade de ficar."

Vinicius de Moraes

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domingo, junho 24, 2007

Moon river...

"Moon river, wider than a mile
I’m crossing you in style some day
Oh, dream maker, you heart breaker
Wherever you’re goin’, i’m goin’ your way

Two drifters, off to see the world
There’s such a lot of world to see
We’re after the same rainbow’s end, waitin’ ’round the bend
My huckleberry friend, moon river, and me

(moon river, wider than a mile)
(i’m crossin’ you in style some day)
Oh, dream maker, you heart breaker
Wherever you’re goin’, i’m goin’ your way

Two drifters, off to see the world
There’s such a lot of world to see
We’re after that same rainbow’s end, waitin’ ’round the bend
My huckleberry friend, moon river, and me."

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Hoje sinto-me assim...

Monica Bellucci

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quinta-feira, junho 21, 2007

Sensation...

"Par les soirs bleus d'été, j'irai dans les sentiers,
Picoté par les blés, fouler l'herbe menue,
Rêveur, j'en sentirai la fraîcheur à mes pieds.
Je laisserai le vent baigner ma tête nue.

Je ne parlerai pas, je ne penserai rien :
Mais l'amour infini me montera dans l'âme,
Et j'irai loin, bien loin, comme un bohémien,
Par la nature, heureux comme avec une femme."

Arthur Rimbaud

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quarta-feira, junho 20, 2007

Cantar...

"Tão longo caminho
E todas as portas
Tão longo o caminho
Sua sombra errante
Sob o sol a pino
A água de exílio
Por estradas brancas
Quanto Passo andado
País ocupado
Num quarto fechado

As portas se fecham
Fecham-se janelas
Os gestos se escondem
Ninguém lhe responde
Solidão vindima
E não querem vê-lo
Encontra silêncio
Que em sombra tornados
Naquela cidade

Quanto passo andado
Encontrou fechadas
Como vai sozinho
Desenha as paredes
Sob as luas verdes
É brilhante e fria
Ou por negras ruas
Por amor da terra
Onde o medo impera

Os olhos se fecham
As bocas se calam
Quando ele pergunta
Só insultos colhe
O rosto lhe viram
Seu longo combate
Silêncio daqueles
Em monstros se tornam
Tão poucos os homens."

Sophia de Mello Breyner Andresen

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A mulher de braços cruzados...

Picasso

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segunda-feira, junho 18, 2007

Conheço o sal...

"Conheço o sal da tua pele seca
Depois que o estio se volveu Inverno
De carne repousada em suor nocturno.

Conheço o sal do leite que bebemos
Quando das bocas se estreitavam lábios
E o coração no sexo palpitava.

Conheço o sal dos teus cabelos negros
Os louros ou cinzentos que se enrolam
Neste dormir de brilhos azulados.

Conheço o sal que resta em minhas mãos
Como nas praias o perfume fica
Quando a maré desceu e se retrai.

Conheço o sal da tua boca, o sal
Da tua língua, o sal de teus mamilos,
E o da cintura se encurvando de ancas.

A todo o sal conheço que é só teu,
Ou é de mim em ti, ou é de ti em mim,
Um cristalino pó de amantes enlaçados."

Jorge de Sena

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Conheço o sal...

"Conheço o sal da tua pele seca
Depois que o estio se volveu Inverno
De carne repousada em suor nocturno.

Conheço o sal do leite que bebemos
Quando das bocas se estreitavam lábios
E o coração no sexo palpitava.

Conheço o sal dos teus cabelos negros
Os louros ou cinzentos que se enrolam
Neste dormir de brilhos azulados.

Conheço o sal que resta em minhas mãos
Como nas praias o perfume fica
Quando a maré desceu e se retrai.

Conheço o sal da tua boca, o sal
Da tua língua, o sal de teus mamilos,
E o da cintura se encurvando de ancas.

A todo o sal conheço que é só teu,
Ou é de mim em ti, ou é de ti em mim,
Um cristalino pó de amantes enlaçados."

Jorge de Sena

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domingo, junho 17, 2007

Em que é que está a pensar?...

"Em que é que está a pensar? A resposta verdadeira a esta questão só poderia ser conhecida pelo próprio, não havia partilha possível. Todos podiam mentir e portanto todos podiam estar seguros. No entanto, o assustador nesta pergunta era o oposto: nenhum dos doentes podia provar que dizia a verdade. Como provar que se está a pensar num determinado assunto? (...)
Em que deve pensar um homem? Para onde deve dirigir o seu pensamento?"

in "Jerusalém", Gonçalo M Tavares

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Antídoto...

"Como o sangue, corremos dentro dos corpos no momento em que abismos os puxam e devoram. Atravessamos cada ramo das árvores interiores que crescem do peito e se estendem pelos braços, pelas pernas, pelos olhares. As raízes agarram-se ao coração e nós cobrimos cada dedo fino dessas raízes que se fecham e apertam e esmagam essa pedra de fogo. Como sangue, somos lágrimas. Como sangue, existimos dentro dos gestos. As palavras são, tantas vezes, feitas daquilo que significamos. E somos o vento, os caminhos do vento sobre os rostos. O vento dentro da escuridão como o único objecto que pode ser tocado. Debaixo da pele, envolvemos as memórias, as ideias, a esperança e o desencanto."

José Luís Peixoto

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quinta-feira, junho 14, 2007

Ah onde estão os relógios que nos davam o tempo generoso...

"Ah onde estão os relógios que nos davam
o tempo generoso
os dedos virtuosos os pezinhos
musicais do tempo
as salas onde o luxo abria as asas
e voava de cadeira em cadeira
de sorriso em sorriso
até cair exausto mas feliz
na almofada muito azul do sono

Onde está o amor a sublime
rosa que os amantes desfolhavam
tão alheios a tudo raptados
pela mão aristocrática do tempo
o amor feito nos braços no regaço
de um tempo fácil
perdulário
vosso

Hoje não é fácil o tempo
já não é vosso o tempo
viajantes do sonho que divide
doces irmãos da rosa
colunas do templo do Imóvel
prudentes amigos da vertigem
deliciados poetas duma angústia
sem vísceras reais
já não é vosso o tempo.

Noivas do invisível
não é vosso o tempo
Relógios do eterno
não é vosso o tempo."

Alexandre O´Neill

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terça-feira, junho 12, 2007

Poema nº4...

"É a manhã cheia de tempestade
no coração do verão.
Como lenços brancos de adeus viajam as nuvens
que o vento sacode com as viageiras mãos.

Inumerável coração do vento
pulsando sobre o nosso silêncio apaixonado.
Zumbindo entre as árvores, orquestral e divino,
como uma língua cheia de guerras e de cantos.

Vento que leva em rápido roubo a ramaria
e desvia as flechas latentes dos pássaros.
Vento que a derruba em onda sem espuma
e substância sem peso, e fogos inclinados.

Despedaça-se e submerge o seu volume de beijos
combatido na porta do vento do verão."

Pablo Neruda

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Garden at Sainte - Adresse...

Monet

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sábado, junho 09, 2007

Hoje sinto-me assim...

Kristen Dunst
"Nunca ter desilusões no amor, é um privilégio dos imbecis."

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Os teus olhos...

"O céu azul, não era
Dessa cor, antigamente;
Era branco como um lírio,
Ou como estrela cadente.

Um dia, fez Deus uns olhos
Tão azuis como esses teus,
Que olharam admirados
A taça branca dos céus.

Quando sentiu esse olhar:
“Que doçura de primor!”
Disse o céu, e ciumento,
Tornou-se da mesma cor!"

Florbela Espanca

Espaço curvo e finito...

Oculta consciência de não ser,
Ou de ser num estar que me transcende,
Numa rede de presenças
E ausências,
Numa fuga para o ponto de partida:
Um perto que é tão longe,
Um longe aqui.
Uma ânsia de estar e de temer
A semente que de ser se surpreende,
As pedras que repetem as cadências
Da onda sempre nova e repetida
Que neste espaço curvo vem de ti.

José Saramago

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As meninas...

Diego Velazquez

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Grandes...

"Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Não são algumas toneladas de pedras ou tijolos ao alto
Que disfarçam o solo, o tal solo que é tudo.
Grandes são os desertos e as almas desertas e grandes
Desertas porque não passa por elas senão elas mesmas,
Grandes porque de ali se vê tudo, e tudo morreu.
Grandes são os desertos, minha alma!
Grandes são os desertos.

Não tirei bilhete para a vida,
Errei a porta do sentimento,
Não houve vontade ou ocasião que eu não perdesse.
Hoje não me resta, em vésperas de viagem,
Com a mala aberta esperando a arrumação adiada,
Sentado na cadeira em companhia com as camisas que não cabem,
Hoje não me resta (à parte o incómodo de estar assim sentado)
Senão saber isto:
Grandes são os desertos, e tudo é deserto.
Grande é a vida, e não vale a pena haver vida,

Arrumo melhor a mala com os olhos de pensar em arrumar
Que com arrumação das mãos factícias (e creio que digo bem)
Acendo o cigarro para adiar a viagem,
Para adiar todas as viagens.
Para adiar o universo inteiro.

Volta amanhã, realidade!
Basta por hoje, gentes!
Adia-te, presente absoluto!
Mais vale não ser que ser assim.

Comprem chocolates à criança a quem sucedi por erro,
E tirem a tabuleta porque amanhã é infinito. Mas tenho que arrumar mala,
Tenho por força que arrumar a mala,
A mala. Não posso levar as camisas na hipótese e a mala na razão.
Sim, toda a vida tenho tido que arrumar a mala.
Mas também, toda a vida, tenho ficado sentado sobre o canto das camisas empilhadas,
A ruminar, como um boi que não chegou a Ápis, destino.

Tenho que arrumar a mala de ser.
Tenho que existir a arrumar malas.
A cinza do cigarro cai sobre a camisa de cima do monte.
Olho para o lado, verifico que estou a dormir.
Sei só que tenho que arrumar a mala,
E que os desertos são grandes e tudo é deserto,
E qualquer parábola a respeito disto, mas dessa é que já me esqueci.

Ergo-me de repente todos os Césares.
Vou definitivamente arrumar a mala.
Arre, hei de arrumá-la e fechá-la;
Hei de vê-la levar de aqui,
Hei de existir independentemente dela.

Grandes são os desertos e tudo é deserto,
Salvo erro, naturalmente.
Pobre da alma humana com oásis só no deserto ao lado!

Mais vale arrumar a mala."

Álvaro de Campos

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domingo, junho 03, 2007

Boa noite, meu vestidinho verde...

"Boa noite, meu vestidinho verde, não consintas que eu te interrompa. Deixa-te estar como estás, na tua cadeira de baloiço, como num berço. Põe as mãos na nuca como as tinhas dantes. Adoro olhar para ti assim, quando o teu corpo descansa preguiçosamente e só as pontas dos teus seios traem a expectativa e inquietação em que ficas quando me aproximo de ti. Desprende os cabelos para que as minhas mãos tenham de ti alguma coisa que as entretenha.
Os pássaros estão soltos? Correste as cortinas de maneira que ninguém possa espreitar para dentro da nossa gaiola doirada? Como as flores resplendem!
Disseste um dia que as minhas palavras são como sementes lançadas no teu coração e que o teu coração era como um solo, muita areia, muitas pedras, mas também algumas jeiras de boa terra húmida. E acrescentaste: era um solo estéril em que as minhas palavras caíam e que um dia daria cem por cada palavra lançada. Será assim quando eu vier ceifar a seara, piedosa e pecadora deusa da criação?
Meu vestidinho verde, tu és adorável como um quadro encantado que os meus olhos animam e despertam para a vida. Ou dar-se-á o caso de só estares encantada quando eu estou contigo? Ou serão os meus olhos encantados que não podem deixar de olhar para ti enquanto as mãos não te alcançam, enquanto os ouvidos não ouvem a tua voz, enquanto a boca anseia pela tua? Essa dúvida toma-me o corpo todo como uma febre instantânea e violenta, na demora de possuir-te.
Apaga a luz. Há muito tempo que os meus olhos aprenderam a reconhecer-te no escuro da noite; há muito tempo que as minhas mãos conhecem todos os vales e curvas do teu..."

Christine Brückner

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